02

Nov 2007

Sobre escrever e trevos

Passando dois anos sem escrever eu aprendi muito.

Escrever é como ter um filho, e manter-se escrevendo é como cuidar de um filho. Mas é o tipo de filho que te faz ser conhecido como pai dele, não como você mesmo. Uma paternidade talvez parecida com a dos músicos…

Traz popularidade, traz fracasso, traz sátira, traz vergonha, traz reprimenda, ou orgulho, ou recompens, ou sonho.

Abandonar um filho talvez seja um dos crimes mais mal vistos, não é mais que matar um pai ou uma mãe, com certeza. Isso tudo é a derrubada de um dos valores fundamentais da cultura, da civilização. Assusta as pessoas ver algo que pode ameaçar aquilo que consideram sua estabilidade.

Eu abandonei o escrever há dois anos, aos poucos, quase sem notar, eu vi meu nome cair no esquecimento de muita gente, vi meu orgulho murchar e se dobrar sobre si, até secar e tornar-se alimento da terra que o alimentou, vi meus dedos doerem, meus olhos incharem, minha garganta secar. Eu notei os sintomas, não notei a doença. Eu traí meus sonhos.

De certa forma ainda não estou morto. O orgulho é uma planta difícil de matar, este orgulho que estou falando aqui. Interessante citar meus trevos que pareciam mortos, estavam murchos, dobrados sobre si mesmos, fechados, mas eu os reguei e eles, no dia seguinte se levantaram, grandes e bonitos como sempre. Nem todos se levantaram, claro, mas aqueles que se dobraram até o fim, até não ter mais forças para se levantar de novo, deram lugar a novos trevos. Começaram em três, um não resistiu, todos os outros estão lá, juntos com mais outros, hoje são cinco, talvez seis, mais um novo que saiu da terra ontem.

Não escrever me faz me sentir velho, e eu sei que não sou velho, sei que sou jovem ainda. Mas sempre que eu tento e sinto como deve ter se sentido aquele trevo que não se levantou mais. Foi a falta de água, falta de carinho a um filho que eu abandonei, que apodreceu dentro de mim e me mata aos poucos.

Mas talvez ele seja como os outros dois trevos.

Enquanto isso eles, não os trevos, simplesmente ‘eles’ para vocês, sentam-se um no meu ombro direito e outro no meu ombro esquerdo e me observam preocupados, não sabem o que fazer. Não sabem que sonho pedir por mim.

Uma vida medíocre é pior que a morte.

E depois de dois anos desaparecido, depois de ter trocado de nome, de ter pedido que se afastassem, quantas pessoas vão ler isto?

Talvez seja só um pouco de romantismo da minha parte, um pouco de ultra-romantismo. Não faz diferença. Eu ainda vou tentar me levantar. E se não conseguir talvez seja mesmo melhor deixar que o corpo apodreça. Existem outros trevos neste pequeno vaso…

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