19

Jan 2008

O elmo de Sandman

Lembram do elmo de Sandman? Que segundo a história foi feito dos ossos de um deus?

Hoje eu sonhei com esse deus.

Ele vivia num “hotel” de paredes grossas que pareciam de marfim, sua família acreditava que eram pobres, ele se disfaraçava ali, vivia exilado. Num dos quartos do piso superior que ele não alugava nunca pra ninguém, ele se escondia toda noite e diziam que se lamentava por um filho seu, que estava desaparecido…

No meu sonho eu invadi esse quarto.

Lá estava ele gritando para a lua, mas sua alma se projetava atrás dela. Lá atrás eu vi (porque ela se projetou com força e me levou junto, e era um sonho também) eu vi o filho dele numa placenta verde, com gomos como os de laranja, o deus enfiava a mão dentro dela e comia um pedaço de algum gomo fluorescente. Era a forma que ele encontrou de ser sempre jovem.

Quando ele voltou percebeu que mais alguém sabia do segredo dele, que mais alguém sabia o que era aquela luz por trás da lua. E decidiu me matar.

Sua espada chamava elefante. Não era uma espada, não tinha gume, mas ele a chamava assim. Era mais uma maça. Eu tinha espada.

Mas o sonho acabou antes do desfexo…

14

Jul 2007

Montanha

Tudo isso se passa num crepúsculo, no instante mais vermelho do céu, num lugar que viu sua sacralidade ascender e decair, viu sua glória e sua decadência.

Muitos anos atrás, quando as pessoas ainda subiam pirâmides para fazer sacrifícios, quando ainda temiam eclipses, quando a fertilidade era associada por todos ao poder de muitos deuses, vivia um jovem talentoso.

Seu nome foi esquecido, mas sua alma observou o mundo por muito tempo, e talvez agora permaneça apenas dormindo.

Naquele tempo a colheita era festejada no pôr do sol, todos festejavam, fogos ardiam, danças circulares, danças de dupla e de grupo, comida e pães para todos. Menos um festejava, um jovem era sacrificado a uma grande montanha que os protegia, como acreditavam.

E o jovem escolhido naquela noite era talentoso, foi erguido no alto da pirâmide de degraus grandes, com serpentes decorando suas laterais, um altar já vermelho de tanto sangue ali derramado. Ele foi erguido e caiu sobre uma espada curta, feia e mal afiada, ela lhe atravessou o coração e sua alma caminhou para o oeste, para onde o sol, naquele exato instante, se punha. Para a montanha.

Ele se tornou montanha, e a montanha se tornou ele.

O que antes foi para ele um ano agora lhe era um suspiro.

Assim viu seu povo abandonar os sacrifícios na primavera seguinte, algo os espantou dali, muitos morreram, a fome os assolou, o medo… Não sacrificaram um num ritual, mas todos morreram de fome, pragas ou guerras. Nenhum morreu em paz.

Mais anos se passaram, seu povoado ficou seco, abandonado, sua pirâmide ganhou o aspecto de ruína, as cores desapareceram, as plantas começaram a crescer sobre ela.

Mais e mais anos. Ele viu gente nova passando por ali com medo, era um lugar amaldiçoado, a montanha não lhe protegia mais, apenas lhe observava…

Séculos e novas pessoas vieram, mas não sacrificavam, não honravam os que antes ali viveram, era diferentes… Nem mesmo a pirâmide respeitaram, transformaram-na num hotel, derrubaram parte de suas paredes e tamparam os buracos com vidro azulado.

O céu era mais escuro e vermelho no crepúsculo deste dia que naquele dia do último sacrifício. A cidade nova crescia, pessoas novas surgiam e a prosperidade era alta.

Falava-se que a montanha voltava a lhes proteger.

Então edifícios ainda mais altos que a pirâmide foram construídos, uma enorme estátua foi construída sobre a montanha, e logo a cidade começou a crescer sobre ela.

Cada crepúsculo era mais vermelho.

Então a última rocha da superfície da montanha foi feita em pedaços, um novo edifício seria construído, a noite era vermelha então, e o crepúsculo durou até o amanhecer, a montanha naquela noite morreu, o jovem talentoso de novo caiu em seu sono, o que antes lhe eram suspiros agora eram eternidades inteiras.

Uma nova praga assolou a cidade e crianças nascidas durante a noite não viam o amanhecer… logo a pirâmide de novo foi assolada com insetos e ervas daninhas, logo os edifícios se tornaram ruínas.

Um raio de sol brilhou no céu, iluminou aquelas ruínas, viu-se azul e verde, algo de amarelo e muito pouco de vermelho.

Mas a montanha e seu povo já estavam mortos.

09

Jul 2007

O lobo me leva a um fjörd distante

Eu cheguei em casa hoje e não tomei café, ando tomando demais.

Tranformei minha escada numa espécie de tripé para pintar, arrumei a tela da porta do quarto, daquelas para atrapalhar a entrada de pernilongos. Tomei banho. Sentei para usar o computador e tive dor de cabeça, enjôo…

Então decidi fazer um exercício de yoga, para alongar as costas, que andam muito doloridas… Fiz, foi difícil, estava tudo tão tenso…

Tenho passado por dias complicados, andava muito tenso, mesmo. Humor instável: medo, mágoa, euforia, tristeza, ódio, paixão… tudo alternando-se, sem ordem, sem me garantir nenhuma segurança…

Eu acalmei esta tarde, e o cansaço pesou. Deitei no chão e logo sonhei.

Um lobo cinza e velho veio correndo até mim e levou a minha alma embora, ele corria, corria muito, corria por um terreno rochoso, a grama era verde, mas o verde de lugares frios e úmidos, era turfa. Ele correu, com minha alma entre as mandíbulas até a beira de um fjörd cinzento, lá embaixo uma baía, à nossa direita o mar, o pôr do sol, de um laranja bem morto, quase cinzento.

Ele olhou para baixo e correu para a esquerda, correu pela beira do fjörd, a poucos metros da queda… E desviou em direção a beira, eu não tive medo, ele ia em direção a uma passagem muito bem camuflada – eu, dentro de sua mandíbula, sabia o que ele pensava, mas não sabia o que queria comigo. – e ele desceu fjörd abaixo, desceu até uma pequena caverna, abrigado da chuva, do frio… a rocha era quente… Mas não do vento!

O vento me tomou do lobo, eu queria voltar, eu me joguei abaixo.

Mas o vento tentou me fazer subir, foi difícil… Vento de pôr-do-sol. Ele conseguiu me fazer subir, mas foi difícil achar o caminho de volta… eu vim carregando algo na mão, acho que um dos dentes do lobo. O peso era grande, e o vento se esforçou muito.

E cheguei de volta a mim, e acordei. Acordei sem as tensões de quando dormi, acordei sem os medos, sem as tristezas e agonias. Elas estão escondidas numa abertura das rochas de um fjörd distante.

20

Jun 2007

Compra-se horas de sono

E hoje eu acordei no meio da noite pensando que não estava sozinho, tinha alguém comigo num iFrame. Era só uma programação de quatro linhas e a pessoa estava em dois lugares ao mesmo tempo.

Mas iFrame também era o nome de uma camisa em formato de delta, que funcionava como asa delta também, e um ursinho de pelúcia vestia.

E indo pro trabalho o ônibus subiu o viaduto mas caiu pela sombra e começou a andar pela via de baixo.

Mais coisas aconteceram, mas eu não consigo lembrar: a minha memória, sim, consegue dormir.

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